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A perspectiva socioemocional na escola

“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender, e se podem aprender a odiar, elas podem ser ensinadas a amar”.

Nelson Mandela

Esta frase de Mandela sintetiza a importância de discutirmos o trabalho com as competências socioemocionais dentro da escola. Estamos vivendo um novo século e ainda nos adaptando a ele; as mudanças fazem parte do percurso do homem, mas o que assusta muitas vezes é a velocidade com que elas vêm acontecendo; dando pouco espaço para pensarmos com calma sobre nosso cotidiano. É crucial que façamos estas pausas para ponderar o que é necessário, importante e essencial permanecer em nossa sociedade e aquilo que deve ser modificado.

As discussões em torno das competências socioemocionais não são novas, grandes pensadores e educadores já frisavam que a aprendizagem não pode ocorrer desvinculada; pensamento e afeto caminham juntos. Nos últimos anos a sociedade, a família e a escola vêm se transformando e algumas coisas que ocorriam naturalmente no ambiente familiar como dividir, esperar a vez de falar, de fazer alguma ação, disciplina, persistência etc., já não são assim tão comuns.  E estes comportamentos são imprescindíveis para a escola e para a vida também. Estas competências relacionadas aos sentimentos e emoções ajudam a lidar com o outro e consigo mesmo. Por tudo isso o socioemocional é tão importante quanto trabalhar com conteúdos e práticas educativas. Educadores e alunos se beneficiam deste trabalho, pois focando no socioemocional, se aprende a alcançar objetivos, gerenciar emoções, desenvolver empatia, aprender a dividir tarefas e responsabilidades etc.

A Harvard Business Review apontou em um artigo de 2015 que diante de um mundo altamente tecnológico, onde robôs desenvolvem tarefas específicas e substituem vários trabalhos dos seres humanos, as habilidades emocionais e sociais tornam-se essenciais. Trabalhar em equipe, saber relacionar-se, ter flexibilidade, criatividade, capacidade de adaptar-se são diferenciais para a vida e para o mercado de trabalho.

Atentos a estas necessidades a BNCC referendou a importância de trabalhar estas competências na sala de aula. Nós convivemos com emoções na escola e o professor pode ser inspirador; os pais e educadores são referencias para os jovens, por mais que possam parecer distantes, são atentos e refletem sobre a postura dos adultos ao seu redor. Assim é imprescindível pensar numa formação para os professores aprenderem a trabalhar com os conteúdos interligados aos aspectos socioemocionais. A BNCC se preocupa com o desenvolvimento integral do aluno e defende, em todas as áreas, que os saberes curriculares ocorram simultaneamente aos socioemocionais. Em matemática aparecem estas orientações: trabalhar com situações-problema, organizar os dados, comunicar ideias, ao lado de flexibilidade, autonomia, autoestima e sentir-se seguro. Deste modo ao trabalhar com gráficos na sala de aula, além de conseguir montá-los a partir de alguns dados é importante que o professor auxilie o aluno a interpretá-lo, a perceber que existem pontos de vista diferentes e convidá-lo a expor e argumentar sobre suas conclusões.

Para que tudo isto aconteça precisamos pensar na valorização do professor; a autoestima do educador é prioridade. As práticas e metodologias tradicionais ainda imperam nas salas de aula; para haver modificações é preciso que haja mais espaço para participação e questionamentos dos alunos. Isto pode incomodar a princípio, mas se ameniza com o tempo na medida que vemos maior motivação e envolvimento dos alunos. A escola deve incentivar novas práticas e subsidiar os educadores com leituras, sugestões, trocas entre equipes para que aos poucos esta nova cultura se instaure.

A BNCC elegeu dez competências gerais e muitos educadores têm usado também o BIG FIVE como referência para nortear as suas ações. O BF fruto de estudos norte-americanos, é estudado e aceito em vários países e no Brasil as pesquisas vem crescendo; em resumo o Big Five procura analisar o desenvolvimento da personalidade humana em 5 dimensões: Abertura a novas experiências,  Consciência ou Conscienciosidade, Extroversão, Amabilidade e Estabilidade emocional. Como trabalhar com estas dimensões na sala de aula? A reposta não é simples, pois precisamos refletir sobre o que está por trás de cada uma destas dimensões:

Abertura a novas experiências significa estar aberto a conhecer e experimentar novas situações culturais e intelectuais; isto implica na formação de um indivíduo curioso, imaginativo, que se abre para escutar pontos de vista diferentes.

Consciência auxilia a desenvolver um senso de organização e foco na realização de objetivos; isto implica na formação de um sujeito responsável, esforçado, compromissado, autônomo e persistente.

Extroversão representa estar aberto ao relacionamento com as pessoas e com o mundo; isto se traduz numa pessoa amigável, sociável e entusiasmada.

Amabilidade representa a capacidade de sair do casulo, tendo disposição para agir de forma cooperativa e solidária, isto se caracteriza como alguém que tem empatia, tolerância, modéstia e sensibilidade para enxergar o outro, aceitando melhor as diferenças.

Estabilidade Emocional significa equilíbrio, com poucas oscilações de humor; traduz-se num indivíduo com autocontrole, coerente, resiliente e otimista.

Como se vê são aspectos importantíssimos que podem ser desenvolvidos na escola, partindo do princípio que uma nova forma de encarar a vida não acontece da noite para o dia. É preciso parcimônia e paciência para promover propostas de trabalho que auxiliem os alunos refletirem sobre sua relação com o outro.

Existem muitas maneiras de trabalhar com o socioemocional na sala de aula, por exemplo:

– Trabalho com projetos: a partir de temas escolhidos e discutidos com os alunos, esta proposta pode incentivar a autonomia, o trabalho em equipe, a percepção de diferentes formas de pensar, a contrição de um produto final (que implica em apreender a ter foco e objetivos finais).

– Trabalho com jogos: permite que se faça antecipações, aprenda a importância do trabalho em grupo e lidar com situações adversas; eles divertem e ao mesmo tempo propõem um trabalho com regras, que desenvolve, o autocontrole e a capacidade de aguardar.

– Trabalho com tecnologias: os alunos como nativos digitais têm mais habilidade que os adultos para usar algumas ferramentas e isto às vezes pode se tornar um empecilho no uso de smartphones, tablets, pesquisas na web etc. O educador não precisa, necessariamente, saber fazer um vídeo para solicitar que os alunos o produzam; a ação do professor é avaliar a produção final. Deste modo ao solicitar que os alunos façam um jornal falado ele irá avaliar a criatividade, a seleção das notícias, a apresentação dos “repórteres” etc. A robótica também pode ser um ótimo recuso para trabalhar imaginação, criatividade, expectativas e regras.

– Roda de conversa: normalmente utilizada na educação infantil e séries iniciais, representa uma ótima oportunidade para que os alunos conversem entre si, consigam observar semelhanças e diferenças sobre o modo de cada um pensar; com isso se desenvolve a capacidade de aceitação do outro, atitudes de respeito e empatia. Isto poderia ocorrer com as turmas dos outros segmentos em forma de assembleias, por exemplo.

– Aluno monitor: permite que alguns alunos possam ajudar outros na hora de realizar alguns exercícios, ou rever algum conteúdo dado na classe; ocorrem aqui possibilidades de troca, capacidade de argumentar, compromisso, organização, etc.

– Atividades extras: ao deixar algumas propostas de trabalho extras para que os alunos possam escolher; cria-se uma dinâmica diferente na sala de aula, por incentivar a autonomia, a escolha e propiciar que os alunos se testem com exercícios mais fáceis ou mais complexos do que aqueles feitos em classe.

– Trabalho com teatro, dramatizações e fantoches auxiliam na criatividade e na possibilidade de se colocar no lugar do outro. Nesta situação intermediária, fazer de conta que é uma outra pessoa, implica em ter que se colocar no lugar dela para pensar e agir segundo suas perspectivas. Esta ação mexe com a imaginação e com a empatia de uma forma muito assertiva.

Há uma infinidade de propostas que poderão tocar nas questões socioemocionais, mas a meu ver é crucial que o educador desenvolva uma boa escuta para estar sempre atento aos seus alunos e perceber as questões que os mobilizam e as necessidades que devem ser trabalhadas. O adulto educador é extremamente importante e o desafio é conseguir superar as adversidades, que são muitas, para criar vínculos de respeito com suas turmas. Algumas pesquisas realizadas por grandes instituições com a Fundação Ayrton Senna, evidenciam que o trabalho com o socioemocional melhora a aprendizagem, ao mesmo tempo em que melhora as relações entre os próprios alunos e os adultos que o cercam.

Altamar Roberto de Carvalho
Diretor Pedagógico da Caburé Assessoria Pedagógica – braço pedagógico do Grupo Rabbit

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